Ghee vegetal: Não é ghee de verdade e nem sempre é do bem

ghee vegetal não existe e nem sempre é do bem

Tenho recebido muitas perguntas sobre o “ghee vegetal”, então decidi escrever este texto sobre o assunto. Informação liberta! E para escolher que alimento ou produto colocar na sua mesa é preciso primeiro conhecer as diferenças entre o ghee verdadeiro e o ghee vegetal. Vamos lá?

ghee não é uma gordura de origem vegetal – ele vem da manteiga da vaca. É um alimento ancestral utilizados pelo nossos antepassados a milhares de anos. Quando o Yoga chegou no ocidente junto com a Medicina Tradicional Ayurvédica passou a ser conhecido, estudado e consumido primeiro pelos Yogis e depois pela galera interessada em alimentação vegetariana e culinária saudável. Mas foram nos últimos cinco anos, que a manteiga ghee, acompanhada de dezenas de pesquisas na área da nutrição caiu nas graças dos nutricionistas, esportistas e simpatizantes das dietas “Paleo” e “Low Carb”. Graças a estudos lindos, acordamos e descobrimos que as “histórias da carochinha” contadas pela grande indústria alimentícia sobre gorduras saturadas – de origem vegetal ou animal, eram uma grande jogada de marketing para empurrar gordura hidrogenada junto com o fator trans goela abaixo da população mundial. Por aqui eu já adianto que esta onda de “ghee vegetal” está no pacote do oportunismo da nova onda do momento. Quer saber mais sobre este assunto? Nas referências deste texto você encontra alguns links de estudo sobre o perigo gordura trans.

Está bem, mas e o ghee vegetal?

Calma! Antes de começar a falar da composição do “ghee vegetal” quero dizer que ghee vegetal” não existe. Não, não existe! Assim como não existe carne vegetal nem leite de cereais, nem mel vegetal. Quem inventa estes nomes para aproveitar o mercado de consumo de produtos do bem deveria ser no mínimo mais criativo, não acha? O mais adequado seria chamar “ghee vegetal” de creme vegetal sabor artificial de manteiga. Este é o mercado desleal com o consumidor e não vou nem entrar na discussão sobre apropriação cultural, por isso te convido a um breve momento há 10 mil anos atrás, para as origens do ghee:

A palavra “ghee” é  hindú e sagrada. Vem do sânscrito:  गोघृत, go-ghṛta e tem muitos significados, entre eles: ouro líquido, néctar, elixir da vida, etc.  É ainda sinônimo de amrita, o néctar da imortalidade.

Nos Vedas, livros sagrados da cultura e sistema de medicina hindu, quando finalmente não se tem mais palavras para descrever o tamanho da sacralidade e auspiciosidade de algum Deus, situação ou qualidade divina, usa-se  a palavra ghee.  Detalhe: os vedas datam de pelo menos 5 mil anos em que foram escritos além de outros 5 mil anos anteriores passados pela tradição oral. Em 10 mil anos de tradição não existe uma única citação nos Vedas falando de “gordura de palma” quanto mais “ghee de palma” ou ghee feito de algum óleo vegetal. O ghee é essencialmente obtido do leite de vacas, sagradas na Índia. 

Na Índia, misturar ghee de verdade e puro com outra gordura vegetal ou animal é um insulto e considerado crime, tem links falando sobre isso no final do artigo.

Agora, vamos entender melhor:

O “ghee vegetal” é gordura de palma com aromatizante “sabor manteiga” e urucum ou outro pigmento alimentício amarelinho. É um produto alimentício a base de palma. Eu chamo de produto alimentício pois não existe uso tradicional documentado sobre o uso da gordura de palma refinado na alimentação de povos ancestrais, somente do uso do dendê que é lindo, da cor do fogo, quase um raio de sol. A palma processada é mais usada para a fabricação de sabão pelos povos africanos, não para alimentação. A gordura de palma é óleo de dendê refinado, sabia?

E de onde vem a gordura de palma para o ghee vegetal? 

A gordura de palma é um óleo obtido do fruto dendezeiro Elaeis guineenses. Primeiro é dendê e depois vira aquela gordura branca  chamada de “shortening” pela indústria. É inodora e sem sabor devido a um processo de refino por solventes, que pode ser de origem natural: realizada com ácido cítrico ou sintético/químico, feito com soda cáustica. Isto vai depender da procedência desta gordura e dos processos utilizados pela fábrica. Refinar = retirar= menos.

Mas a palma faz bem para a saúde? É um óleo do bem?

Sim e não. Eu explico. A gordura de palma, é uma gordura com ótima estabilidade oxidativa para cozinhar, por exemplo, assim como o ghee e o óleo de coco é rica em gorduras saturadas de cadeia curta e média, gorduras do bem sim! Sugiro que leia os artigos referenciados para aprofundar neste assunto (ver referencias 1.5, 1.6 e 1.7).  A gordura de palma tem uma composição rica em ácidos graxos essenciais, mas devido aos processos de refino acaba perdendo muito de seus micronutrientes. Quanto à composição, ela tenta se aproximar do óleo de coco e da manteiga ghee mas não consegue chegar lá com relação às vitaminas, ácidos conjugados entre outros micro nutrientes que estavam no dendê antes do refino. Você pode inclusive pesquisar a diferença entre o “red palm oil” e o “palm oil” e constatar os incríveis benefícios da palma não refinada ou dendê e entender essa grande diferença da gordura de palma branquinha e sem graça que não consegue nem ser ghee, nem ser dendê (2.2 e 2.3). O quadro abaixo é bem simples, não traz números mas já dá uma noção para esta comparação. Há também uma tabela completíssima da composição de ácidos graxos do ghee que fabricamos aqui.

Substância Manteiga Ghee Óleo de palma
Ácido butírico Contém Não contém
Ácido Linoleico Conjugado CLA Contém Não contém
Ácido Láurico Contém Contém
Ácido Merístico Contém Contém
Ácido Palmítico Contém Contém
Ácido Esteárico Contém Contém
Ácido Oleico (ômega 9) Contém Contém
Ácido Linoleico (ômega 6) Contém Contém
Ácido Linolênico (ômega 3) Contém Contém
Vitaminas A, D, E e K Contém Traços

E de onde vem a gordura de palma?

Agora nós vamos chegar no X, Y e Z da questão sobre o óleo de palma. Não é porque a palma é uma gordura do bem para o corpo que ela é do bem para o planeta, nossa casa, nossa sagrada mãe terra. Vamos ao fatos:

– 85% da gordura de palma produzida no mundo vem da Indonésia e da Malásia, em sua chocante maioria, fruto de trabalho escravo. Estima-se 3,5 milhões de trabalhadores sofrem abuso e violência nos campos da palma: homens, mulheres e crianças.

– 15% de toda biodiversidade do planeta estão nas matas da Indonésia entre animais e plantas e grande parte da população depende das matas para viver.

– Desde 1960 mais da metade das matas da Indonésia foram destruídas e queimadas para virar plantação de dendezeiros para obtenção de palma para indústria alimentícia. Os povos nativo/indígenas foram expulsos de suas terras e animais como tigres e orangotangos ficaram sem casa ou queimados vivos no processo.

– Atualmente, as plantações de dendezeiros já cobrem mais que 27 milhões de hectares em todo o mundo. Numa área do tamanho de toda a Nova Zelândia, as pessoas e os animais já tiveram que dar lugar aos “desertos verdes”.

No final deste texto, você encontra muitos links para vídeos feitos pelo Green Peace entre outras inciativas e páginas falando do grande problema mundial que é a produção de gordura de palma hoje.

  “Ghee vegetal” feito com gordura de palma sem certificação NÃO é Vegan, nem é ghee.

 

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8 respostas para “Ghee vegetal: Não é ghee de verdade e nem sempre é do bem”

  1. Excelente texto, muito lúcido! É comum ser atacado quando se sustenta com fatos as verdades incômodas. Tb acho que esses termos são infelizes – outro dia me deparei com um “açougue” vegano (como assim????). Concordo quando vc chama alguns de oportunistas, pq eles lucram com a ignorância de muitos. A suposta superioridade moral (o “amor”) pregada pela militância vegana (os chatos e revoltados) é de doer. Obrigada e, por favor, continue sua jornada de propagação de conhecimento legítimo!

    • Obrigada Katia, seguimos sempre em busca do conhecimento verdadeiro e para clarear o entendimento sobre saúde e alimentação. E também estamos dispostos a rever nossos conceitos e evoluir pois tudo se transforma. Abraço, Dai

  2. Excelente matéria! parabéns pela riqueza do conteúdo e pela nobreza na comunicação! Me senti na obrigação de comentar pois não é todo dia que encontramos explicações tão bem estruturadas e de uma forma tão leve!

  3. Sinceramente, o texto é péssimo torcendo a verdade. Como não existe carne vegetal? Como essa pessoa teve coragem de afirmar que é oportunismo devido a “onda do momento? ” Conhece as pessoas? Que direito tem alguém de ser tão ofensivo com quem nem conhece. Todos nós sabemos bem que carne é de animal, não somos ignorantes. Eles não estão enganando ninguém. O nome carne entra porque substituiu a carne de animal que vem da dor e do sofrimento de seres inocentes. A nova onda seria ter sensibilidade? Não quer participar de tamanha crueldade? Que texto lamentável. Poderia ter explicado sobre tudo o mais com educação, com elegância. Sim a parte sobe o que acontece na Indonésia…que eu já sabia, é importante. Mas atacar os produtos veganos foi demais. E tem gente que aprova….Estão achando uma maravilha. Quando vão aprender o significado do amor?

    • Oi Virginia, antes de responder o teu comentário eu reli o meu texto para tentar entender o que te causou tenta revolta. Estou te respondendo este comentário com muito amor viu? E ao ler, gostaria que tentasse não encontrar mensagens ocultas nas entrelinhas, pois elas não existem. Sinto que hoje mesmo quando escrevemos as coisas com boas intensões o impacto na postura de quem lê fala muito mais sobre o leitor do que sobre o escritor.
      Primeiro quero dizer que eu como mãe de três filhos conheço bem o significado do amor, esse sentimento não é exclusivo de pessoas veganas.
      Na minha longa caminhada de estudos de alimentação já errei muito, mas os meus maiores erros foram justamente quando eu era “a vegana chata e revoltada” e que costumava a ofender amigos e familiares na mesa do jantar, vegana de apartamento que esqueceu que suas raizes vieram da agricultura familiar.
      Eu já fui vegana estrita, vegetarina por mais de 10 anos e hoje sou onívora. Digo isso para contextualizar um pouco a minha resposta. Com amadurecimento, muito estudo e buscando uma alimentação dentro de um contexto agroecológico levo hoje minha bandeira e baseada neste estudo volto a afirmar aqui: ghee vegetal não existe. Se você leu atentamente o texto vai perceber que eu elenquei “N” razões – culturais, nutritivas e químicas embasando minha afirmação. Entendo que o movimento vegano se apropria – não no sentido pejorativo! dos termos “carne e leite”,como exemplo, mas é diferente do ghee. Ghee é um alimento ancestral e seu nome é ligado a uma tradição.
      Quando alguém compra carne de soja, tem certeza que ali não tem carne animal, porém quando alguém compra creme vegetal saborisado por ghee esta pessoa não sabe que aquilo está longe se ser ghee de verdade. Quando um nutricionista indica a uma pessoa com síndrome do intestino irritável que consuma ghee pois os ácidos graxos presentes neste alimento (CLA, ácido butírico..) ajudam a tratar esta doença e a mesma compra um creme vegetal ela está sendo enganada entende?
      Olha, sobre crueldade, sofrimento de seres inocentes e holocausto animal eu conheço bem. Já vi todos os filmes e documentários, como disse, já fui vegana de apartamento, mas sabe, eles expressam somente UMA parte da realidade. Quem sabe você visita um sitio de agricultura familiar, esta agricultura que é responsável por 90% da comida que está na mesa dos brasileiro, que produz comida de verdade e não produto alimentício. Quem sabe você se apropria de outras partes de uma realidade e veja com amor e gratidão também este lado. Meu texto não tem pretensão nenhuma de atacar produtos veganos, aqui na Yamuna a maioria dos nossos produtos é vegano, aqui em casa adotamos alimentação vegana vários dias na semana e principalmente eu acredito que o caminho para a nossa evolução passa sim, por uma maioria vegana ou vegetariana no planeta.
      Um abraço, boa caminhada!

  4. Fiquei chocado com tamanha atrocidade realizada pelos indonésios. Isso não tira o brilho da matéria acima tão elucidativa.

  5. Obrigada pelo texto, pois comprei hoje uma ghee vegetal e agora soube melhor como é feita e o que a procedência do fabrico de óleo de palma refinado (dendê), ou seja, do desmatamento da floresta da Indonésia e do trabalho escravo. Cruzes!!! Nunca mais!

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